quarta-feira, 6 de agosto de 2014

País das Maravilhas

Um pouco mais de poesia nesta noite escura,

Nesta vida estranha com gosto estranho no final.

Um pouco mais de fantasia pra esquecer desta cidade que nasceu falida,

Um pouco menos de pés cheios de chão e solidão.

Um pouco menos de drogas evitando a sanidade pra se olhar no espelho.

Um pouco menos de você aqui para me lembrar de tudo que eu não sou, pra me sugar tudo que eu não tenho, pra me tirar a força e a razão. Pra fingir que sua perversão é mais digna que a minha.

Um pouco mais de pés descalços em passeios matutinos sem culpa ou receio.  Sem segredos ou ameaças.

 Um pouco mais de você sem mim, assim, devagar. Um pouco mais do seu inescrupuloso sorriso e gozo longe de mim.  

Um pouco mais de luzes atrapalhando as sombras das árvores, as vozes nas casas cortando o silêncio, um pouco mais do cotidiano, rotineiro e banal.

Um pouco mais de vida nesta pulsão de morte, de ilusão neste poço de realidade, um pouco mais de cogumelos coloridos e gatos falantes.


Um pouco mais de felicidade, mesmo que seja inventada. 

terça-feira, 5 de agosto de 2014

You know, you're right

Eu poderia esperar por você
Mas acho que já fiz isso demais
Eu poderia te procurar nestes buracos que você gosta de se esconder
Mas eu não vou me sujar mais
Eu poderia jogar você da ponte
Mas eu não quero te ajudar mais
Você está certo
Está sempre certo
Está tudo certo
Eu só quero te negar ajuda quando você precisar
Eu quero encher os seus bolsos de formol para que você cheire como a morte
Eu quero desestruturar esses seus pensamentos de amor
Porque isso não é amor
Eu queria te esquecer
Mas acho que já fiz isso demais
Você está certo
Está tudo em sua certeza
De que o mundo vai te acolher mais uma vez
Eu poderia até te encolher
Para que você virasse só um retalho nessa confusão
Mas não quero me despedaçar mais
Não tem mais o jeito certo
Apenas o seu jeito
Nós estamos flutuando nessa imensa nuvem negra
Nós estamos viajando no seu avião
E todas as noites ele colide com o nada.
Eu não quero mais de você
Não quero mais ter que ceder
Nem esquecer. Nem tentar.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Ode à desagregação I

Vista nossas roupas imundas
Vamos comemorar nosso desarranjo
Essa coisa estranha
Todo esse cheiro pútrido de vontades mortas
Variantes idiotas
Em todos estes ângulos destoantes
Nós podemos
Sonhar com a aventuras em vórtices alagados
Vamos fazer sexo sem proteção no telhado
Vamos estraçalhar o que não seguramos
Estejamos prontos para esquecer
Estejamos em ponto de adormecer
Em toda essa lamúria gélida com gosto de desgosto
Passe as mãos pelos meus cabelos
E diga que eu vou sentir coisas diferentes
Que eu vou experimentar mais uma vez o veneno agridoce que me tira desse corpo
Que me atravessa pelos chãos
Por todos os meus nomes
Que vai colocar pontos em minhas palavras sem sentido
Me pegue nos braços
E faça de mim algo melhor que um papel
Faça eu ser
Enquanto descubro como é existir
Faça eu ainda ser
Enquanto eu me deixo esvair
Segure a minha cabeça
E me deixe pensar em coisas obscenas
Sair nua na rua em pelo em selo, transviar, viajar, transgredir, desaparecer
Vamos fingir que somos heróis pós-modernos
Não aceitar subjugação
Não deixar morrer a companhia pela falta de amor
Vamos imaginar que somos até mais do que queríamos ser
Vamos dançar até morrer
Vamos dar as mãos e nos empurrarmos pela escuridão
Vamos nos distorcer
Deixar entorpecer
Entregar nossas sóbrias alegrias
Jogar fora a determinação
E queimar enquanto houver som.


domingo, 3 de agosto de 2014

Shift

Estou no escuro mas a luz fria da lua banha meus pés
Ainda não é tempo de ser feliz, isso virá
Por enquanto devo me contentar com os prazeres não imediatos
Com os crimes dos outros
E deixar os sonhos serem corroídos por faíscas de vontade
Então é isso
Ficar aqui e assistir à falta de glória das memórias ausentes?
Acho que não
Eu planejei mais, eu preciso de mais
Uma volta em torno do sol é muito pouco
Não são tantas oportunidades
Não há onde desperdiçar
Não há quasar no qual eu não queira pulsar
Não há feixe de luz no qual eu não queira me incendiar
Não há água na qual eu não queira me afundar
Houveram apenas vislumbres disso
Mas hoje eu ando pela borda
Guardo os desejos incautos na mala
Ligo a minha lanterna para irradiar luz silenciosa
e observo o tremular dos ventos na minha direção.