domingo, 29 de novembro de 2015

Lua de fel

Esconde-se tanto
que não te vejo todo
Parece-me antes, toldo
Escolho-te como desafio
E não como opção

Do seu gozo alucinado
Bebo louca
Na sua boca
O gosto difuso
do querer e do afastar
ao encostar
o meu desejo na sua cintura
vilipêndio do seu espaço
cercado
minúcias
desmantelamento das defesas
e ainda tentando passar o mar pelos seus fiordes
ainda tentando ver chão nas suas águas

Abraço-te inteiro
Sentindo sua censura
Amo-te em desesespero
E sabes que não sou sua
Inteiro
Despedaço
Novelo
Desenlaço
Costura
Afrouxo
Minerva
Nirvana

Afirmo-te
Sem jurar
Que entre as esperas minhas
Não está
Esqueço-te em vigília
Pra de noite te lembrar
Faço uma ou duas orações
Antes de te encontrar
Pra ver se na terra do meu desejo
Você pode fechar os olhos e esquecer de si
Quero te fazer meu ventríloquo
Te suprimir
Meu mímico
Parte de mim
Objeto e fonte
do meu desejo

Se te toco em insistência pura
Sou alma que apavora e assusta
Se te cubro de possibilidades
Vê-me mal, duvida da minha verdade
Só te pretendo em dúvida
vastidão impensável de contrastes

Pelos meios não vemos se há altura
E se saída, não cruzamos olhares
Queria-te como uma prosa
Mas só te tenho enquanto filosofia
Guerra invencível que luto
Pilhando o tempo
Queimando as horas
Procuro ver-lhe os olhos pela armadura que veste
Mas não me obedece
Sobe o escudo e protege-se
Não sou soberanda no seu império

A falta de destreza
Estranha
A disputa em que acredita
Estraga
A melhor face
Oculta
A mina não é de ouro
é carvão
Carbono em desorganização
Essência mínima empertigada em sopro
Mas não sabes moldar
Tenha a ti mesmo
Ou nunca nenhum de nós te terá

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Fantasística

Sempre caindo
Sempre pendendo
Habitando os ares
Sendo em movimento
E, mesmo assim,
morrendo.

Acendo a vela, rezo
danço e insisto
Sou do mundo que avassala
Sou da voz que me submete
Sou do corpo que me protege
E uso, discurso,
Confesso
Confusa
Sou humana, do ventre
da mãe, mas não sou ala
Sou filha e sou memória,
Sou incerta
Sou discórdia

Nunca pelo desvio
Sempre pela promessa
Às vezes pela rédea
Hoje pela metade.

Se de tão fina lisura
entrego as mãos em cortesia
visto em tinta, pó e listra
Fantasias de que sou lisa, lira e lua
Mas ponho-me a suspeitar,
enquanto afago a boca cheia de dentes,
que não sou alma pura
Escuna torta, não barco de fuga
Sombra no canto da porta
Sobra na soma das notas
Anseio no contento
Ensaio
Por trás, tiras
sofrimento
do plantio sou
mas em aparência, lodo
me esfumo nos cantos
com soslaios de mim.


domingo, 22 de novembro de 2015

Diálogos do submundo

O tempo, esse velho astuto e rude, me deixou com a garganta seca. Eu tentei respirar fundo, prender o ar por alguns segundos e depois soltar, vagarosamente. Infelizmente, imersa na realidade. Tudo que tive foi aquela Frida me dizendo o que fazer. Deixar pra trás e seguir, é o que todos fariam. É o que se deve fazer. Sim, claro. Elementar, não fosse a lei independente que rege um psicológico meio fodido de tempos em tempos. Eu quase não tive coragem de dizer algumas verdades pro espelho depois que tudo passou. Eu sempre achei que apontar os erros com o indicador imperativo fosse uma estratégia eficiente de atentado ao pudor da sanidade. Não funciona realmente. Veja bem, o que acontece é a abertura de uma fresta por onde espreita a Urgência, esse bicho que insiste em se portar como uma úlcera.
A verdade é que eu tentei fugir de várias maneiras, mas eu nunca me deixei escapar pela janela do ônibus, aquela greta por onde você baforava a fumaça do seu cigarro. Eu quis me disfarçar de ponto cego pra você tropeçar na rua e quebrar um dos tripés da sua vida, eu só não consegui ser tão má. Eu não sei o que me faria sentir mais viva: espalhada fumaça cinza em seus pulmões ou usar aquela fantasia pra qual você não suportaria olhar. Em vez disso, eu me fiz sem face, sem nome, sem endereço. Eu morri e nem sei em qual mês.
Hoje remendada, pouco menos que a falha. Hoje eu tento me afogar em qualquer teor alcoólico meio raso, pra poder sentir o estrago aos poucos. Hoje eu me fiz de boba, usando aquela camisa desabotoada na gola, por onde escapa a falta de ar. Hoje eu sou falta de foco, falta de colo, hoje eu sou par de meias inutilizáveis pela posição fetal exigida pelos músculos, que preveem uma atrofia generalizada da vontade. Hoje eu sou pó, nem lembrança. Hoje eu sou a voz sussurrando perto do martelo pra fazer ritmar contrações involuntárias de pêlos periféricos pelo corpo, o qual um dia pôde ser realizado por uma experiência quase concreta.
E é tudo, eu durei enquanto prestei. E foi pouco. Não mais que noites de um verão qualquer. Eu quase me devorei na órbita do seu umbigo. Eu deveria. Como eu poderia saber? A verdade é que, nesse jogo, você se engana ao pensar que saiu ganhando. O tempo dobra a próxima esquina, você ainda se deparará com a pressa falida e cega. A culpa também foi sua. E não adianta assobiar alto, o perigo tem bons ouvidos. E contra nós, meu caro, você é o pior inimigo. 

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Death

Acerca do sim,
Mais afastada:
Dá caneta à navalha.
Não queria pôr fim,
Não queria, por fim,
Ao que restava:
Arremedo de vida, de menina.
Mas via-se obrigada.
Adiantada, dava adeus
Aos anos espalhados,
Aos ventos jogados,
Enquanto virava pó,
Desejando ser a ressaca
A ser consumida, experimentada,
Ao menos,
Existente naquilo que te mata.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Breu

Acabou a luz
Desligou-se tudo.
Só há eu e o escuro.
Como vou saber que não estou morta?


Pangeia

Procurei o seu beijo
Como se ao encontrar
Fosse fixar casa na lua
Fosse encontrar saída pro mar


Zeppelin

Passei os olhos por seu corpo
Assim como passo as mãos pelo rosto
Quando você me agustia


domingo, 8 de novembro de 2015

Rotação

O que muda,
Mudo mundo?
Quando muda
O mundo meu
Que, mudo,
Muda o seu.
O mundo de mudanças
Que faz o meu mundo mudar
Quando muda o seu mundo,
Fazendo-o girar.
O mudo mundo seu
Que muda o mundo meu,
Que, mudo, se aproxima
Transmitindo mudanças,
As mudanças mundanas
Que mudam caladas
Os mudos mundos mudados.