O acaso, a
sorte, as contingências, o destino – ou seja lá o que se acredite que a vida
seja – tem brincado comigo. Nada resiste à atrocidade do tempo. Infelizmente.
Ou felizmente. O que torna uma vida possível de ser vivida, no entanto, é a
capacidade que temos de esquecer – e aí eu me apoio em Nietzsche. Não me apoio
em seu ombro, numa mesa de bar. Me apoio nas coisas que ele mesmo queria que se
fizessem lembrar. Engraçado. A verdade é que, na verdade, não existe verdade.
Existem fatos. Existem. Existem? Pode existir o fato isolado, ali, separado.
Sem que seja interpretado. Mas, partindo dessa perspectiva, saímos do nosso
ponto de referencial, abandonamos o principal sentido de ser – nós mesmos. O
que damos ao fato, então, é um toque de subjetividade característico de cada
um. E aí, meu caro, caímos na própria armadilha da qual tentamos fugir.
O
problema disso tudo, ou a solução, ou até mesmo não seja um problema ou uma
solução, mas apenas o modo a partir do qual as coisas acontecem, é que estamos
emaranhados em redes de sentidos criadas por nos e pelos outros, saturadas de
“fatos subjetivos”, completamente relacional, passível de várias
interpretações. Estamos todos ao relento. Eu sempre tive medo de estar ao
relento, de não ter nada a que me agarrar se as coisas começassem a desabar
sobre mim. E até hoje, tendo vivido o suficiente para perceber que é assim que
a vida funciona, eu ainda não me acostumei. Eu não me acostumei com a ideia de
ter que me adaptar à vida – não o contrário (sou de difícil adaptação).
Eu
esperaria concluir esse devaneio. Mas, se ele diz de nós e da vida, o certo é
que eu não o conclua. Não, o certo não, o adequado é que eu não o conclua. Não
me atreverei a julgar o que venha a ser certo ou errado nessa cartilha de
infinitas possibilidades de combinações delimitada pela linha imaginária
chamada tempo, que alguém muito sagaz teve a destreza de criar. E não o
concluirei justamente para deixar um gosto e uma sensação estranha. A mesma
impressão que a vida provoca em mim sempre que me pego tentando decifrá-la. Ela
sempre me golpeia dessa forma. Sempre me deixa uma reticência, uma falta de
fim. O que torna a experiência de existir estritamente singular e paradoxal.
Se, por um lado é bom que não tenha conclusão – estamos em constantes mudanças,
movimentos, ventos –, por outro prova, da maneira mais explícita (ou pelo menos
deveria provar), que só sabemos que nada sabemos. Se hoje fosse o meu último
dia de vida, eu diria que sai dessa experiência de viver cheia de incertezas,
encarando as infinitas possibilidades com o mesmo medo que tinha quando me
introduziram neste mundo. Mas agora, me atrevo a sorrir frente a elas. E,
sinceramente, não sei se isso faz alguma diferença.
Nenhum comentário:
Postar um comentário