E, de repente, ela se ajoelhou
aos meus pés e começou a chorar. Desesperada, tinha as mãos trêmulas e um medo
estranho de abrir os olhos. Perguntei várias vezes o que havia acontecido,
chamava por seu nome, mas ela se preocupava apenas em chorar e soluçar. Por
fim, depois de horas naquela mesma forma, ela ergueu seu olhar e me perguntou,
numa voz rouca e falha, o porquê da minha displicência. Eu, num tom sereno,
disse que não havia mais nada na vida que pudesse me surpreender. Ela então
olhou com olhos de curiosidade a desconhecida que se construíra na sua frente
durante tantos anos sem que ela percebesse.
- De qualquer maneira, o motivo
que te deixou assim deve ser mais importante do que essa discussão acerca do
que eu sou ou não.
- O que eu mais temia aconteceu.
As mentiras, a sujeira em que eu me meti. E tudo por culpa dele. Julguei que
seria até bom participar de tudo isso, mas e agora? O que é que eu tenho? O que
me restou? – neste momento ela olhou para as mãos vermelhas a procura de alguma
resposta.
- Calma, você não tem motivos
para ficar assim. As suas expectativas só dizem respeito a você.
- Eu não acredito que você está
me dizendo isso. Você tem noção do que ele fez?
- Tenho. Isso fazia parte das
possibilidades e você sabia.
- Mas eu nunca imaginei...! Você
deveria estar do meu lado.
- Eu não tenho lado. Nem partido.
- O que você é? Um ser sem
opinião? Sem julgamentos? Acha que isso te levará a alguma conclusão?
- Isso pode até não me levar a
nada, mas com certeza eu não ficarei igual a você.
- Se não for para ajudar, eu
prefiro que você fique calada, disse ela rispidamente.
- O meu jeito te incomoda e eu
sou a culpada?
- Então é isso que você pensa do
mundo, das pessoas à sua volta? Você acredita em algo? Existe alguma coisa
capaz de te fazer feliz?
- Não sei, estou descobrindo. Por
enquanto, ocupo-me em observar, sentir. Conclusões representam, de certa forma,
o fim. Não me acho capaz o suficiente para decretar o fim de alguma coisa em
minha vida agora.
- E você acha que é assim que se
faz o futuro? Com pessoas como você?
- A sua certeza me inveja. O seu
julgamento também.
- Eu não entendo você. Como quer
melhorar, crescer?
- Eu não posso dizer nada, mas a
propriedade com que você afirma tudo que sabe me inveja. A sua teoria de que
não se deve não se apegar a nada vai totalmente contra a liberdade que você
mesma prega. As pessoas não pertencem umas às outras, elas não tem que,
necessariamente, seguir e apontar algo como verdade absoluta, é muita
prepotência para pouco ser humano. Se você pudesse se observar por um instante,
perceberia que você não passa de uma pequena engrenagem que faz parte de uma
gigante máquina da qual, sequer um dia, tomará conhecimento do funcionamento.
As coisas são mais simples do que parecem. E mais complicadas do que aparentam.
Se olhar com atenção, verá que sou tão contraditória quanto você. Mas não se
assuste, é a nossa essência.
Afastei-me vagarosamente sem
olhar para trás e ela continuou me olhando com olhos espantados, como os de
quem acaba de ser apresentado a alguém anormal. E era exatamente isso que
estava acontecendo.
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